sexta-feira, maio 10, 2013

Conseguiram fazer algo mais perverso que as cotas raciais: bolsa para estudantes pobres.


Uma coisa é a bolsa-família, onde cada FAMÍLIA (pelo menos pai, mãe e filho) ganha, no máximo, R$ 306/mês (considerando uma família miserável e com penca de filhos). Imagine-se VOCÊ ganhando esses R$ 306/mês para sustentar pelo menos MAIS DUAS PESSOAS. Você conseguiria? Pois é... Não daria nem para você.

Agora muda-se a situação: você está na universidade pública e gratuita, e você também se encaixaria na mesma condição de miserável (aí você pode ser cotista ou não). Você fatalmente conseguirá ficar em moradia estudantil (que é um pardieiro, mas é de graça). Assim que você consegue se assentar na faculdade qual é a primeira providência que você toma? Vai atrás de um ESTÁGIO para conseguir EXPERIÊNCIA (se você fosse mais esperto iria atrás de um EMPREGO de verdade com carteira assinada, que vale mais que estágio para o mercado de trabalho). 

Verifiquei o site da Catho agora e procurei um curso que geralmente paga as melhores remunerações para estagiários (Direito) em uma cidade com um custo de vida alto (Brasília). A média dos estágios está em R$ 1000. O curso de direito tem estágio obrigatório, então não dá para escapar disso, mas imagine-se que você já consegue um estágio ANTES disso, para que você já tenha 2 anos de prática e uma recomendação em seu currículo. E, para facilitar, que o auxílio em seu estágio para os mesmos R$ 1000. Você não tem auxílio-refeição (R$ 242) e pode receber auxílio-transporte, mas esse não cobre o deslocamento escola-casa (uns R$ 66/mês). Assim, se você tem um modo de vida espartano (você sabe que NÃO), conseguirá tirar R$ 692/mês. Sem contar os aborrecimentos indiretos (ter que se vestir de uma determinada maneira - no caso dos futuros advogados, terno e vestidos -, o tempo que se perde nos deslocamentos, o pessoal que pega no seu pé no trabalho, etc.).

Agora vamos mudar de situação: você entra na universidade e consegue uma BOLSA de R$ 400 já no segundo semestre (porque suponho que no primeiro você ainda terá que lidar com a burocracia). Por cerca de R$ 300 a menos que os líquidos que você tiraria no estágio você (ou R$ 350 se você mora no alojamento estudantil e não tem essa viagem extra) terá todo o tempo do mundo para estudar e se dedicar à sua saúde mental, não terá colegas chatos de trabalho e pode se vestir da maneira que quiser. Sem contar que suas despesas com comida seriam drasticamente diminuídas, já que você almoçaria no RU.

Claro que a escolha óbvia seria pelo estágio, mas pense: 1) quantos são os estagiários de começo de curso que ganham o mesmo que os que estão terminando?; 2) e se seu curso não for direito. Por exemplo: no mesmo site da Catho um estágio para quem está no primeiro ano de ciências contábeis paga R$ 678. OK, é meio período, mas ainda há o deslocamento para o estágio e os colegas chatos. Será que isso custaria esses R$ 278 extras?

Então vamos mudar de novo: imagina que você é um índio ou quilombola e ganha uma bolsa de R$ 900/mês. Você toparia estagiar e ganhar MENOS? Ou então pegar um emprego de carteira assinada que paga salário mínimo. Enfim, essa decisão do MEC acabará fazendo mais mal que bem. Porque quando terminar a graduação essa pessoa provavelmente irá fazer uma pós-graduação e irá atrás da bolsa da CAPES (mestrado tá atualmente R$ 1400, por dois anos). Depois disso irá para a bolsa de doutorado R$ 2200, por quatro anos. Se der sorte ainda pega a bolsa pós-doutorado, de R$ 4100, por mais quatro anos. Daí ele vai para o mercado de trabalho... Se dar mal, porque é "superqualificado" (isso já no mestrado). Daí resolve fazer concurso para professor. Não passa, porque não é da "tchurma". Daí ele vai dar aula na faculdade privada. Se for doutor provavelmente vai ficar desempregado, já que para a CAPES um curso de graduação já está bom o bastante se tiver professores com pelo menos o mestrado, e a hora/aula do doutor custa mais. Mas supondo que ele acabe conseguindo emprego na faculdade, ele não vai poder ser tão rigoroso quanto ele queria, pois se reprovar demais será demitido por não "fidelizar o cliente". Se ele ousar responder a um aluno filhinho-de-papai será demitido. Ele não terá autonomia para dar o que achar melhor para os alunos com a metodologia de avaliação idem porque provavelmente deverá seguir um currículo antiquado e imbecil.

Tudo isso poderia ser mudado se ele tivesse feito o estágio de salário mínimo lá no começo...


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