segunda-feira, fevereiro 07, 2011

Sobre o Egito 1 - Mirem-se no exemplo do Brasil

Já leram "Júlio César", do Shakespeare? Bem, toda tragédia do Shakespeare gira sobre um tema: loucura (Hamlet), ciúme (Otelo), velhice (Rei Lear), etc. "Júlio César" traz a seguinte mensagem: "todo ato pode causar consequências que, às vezes, são as opostas de quem o praticou". Posso contar o que aconteceu porque é história: Júlio César virou ditador (significado diferente do que se tem hoje) de Roma. Alguns senadores romanos viram isso como uma ameaça à República e resolveram dar cabo da maneira mais simples possível, matando-o. Com isso, pensavam, estavam salvando a República. Mas na verdade, eles ACABARAM COM A REPÚBLICA, possibilitando a ascenção do segundo triunvirato e, por fim, o império de Otávio Augusto.

(Quem não gosta muito de história pode se inspirar no Episódio III de Guerra nas Estrelas: o mestre Windu queria matar o então senador Palpatine para conservar a República; não conseguindo, não só acabou com a República como fez com que Palpatine virasse imperador).

Pois bem, vejam o que acontece no Egito: cansados de uma ditadura de 30 anos, os egípcios estão há uns 10 dias protestando pedindo a cabeça do Mubarak. Tudo ocorreria em um tom normal se não fossem duas coisinhas:

1) O Egito é a pátria da Irmandade Muçulmana, mãe ideológica de todos os movimentos fundamentalistas islâmicos. A Irmandade, diga-se, é a oposição mais bem-organizada daquele país;

2) Historicamente no islamismo, a esfera da religião NUNCA foi separada da esfera do Estado. Maomé foi ele próprio um estadista. E não há nada no Corão que tenha um conteúdo parecido com "meu reino não é deste mundo", "dai a César o que é de César, dai a Deus o que é de Deus". Esperar que isso alfore assim do nada não é recomendável.

Dito isso, o que resta a fazer? Em primeiro lugar, que a Irmandade Muçulmana NÃO chegue ao poder após esta tribulação. Se eu fosse do estado egípcio atual eu analisaria processo de transições democráticas de outros países, com três destaques: Espanha, Africa do Sul e Brasil. Como não há a alternativa de um rei para garantir a unidade da nação, a Espanha está descartada. Como ainda não há uma renúncia pela Irmandade Muçulmana à implementação integral da sharia, a alternativa sul-africana também deve ser descartada. Resta à do Brasil:

- Anistia ampla, geral e irrestrita a ambos os lados;

- Criação de um sistema eleitoral tão complicado que seja impossível a Irmandade Muçulmana conseguir maioria de primeira;

- Eleições indiretas para presidente na primeira eleição presidencial;

- Eleição de uma Assembléia Constituinte, mas da mesma forma impossível para a Irmandade Muçulmana conseguir uma minoria ao menos qualificada;

- Eleições diretas para presidente na segunda eleição presidencial, de 5 a 10 anos após a primeira eleição indireta..

Eu sei, não é uma situação muito otimista, mas a questão tempo é a única esperança para que os ânimos se arrefecem e que ou surja um eleitorado majoritariamente moderado que rejeite a visão revolucionária da IM ou que a própria IM modere a sua postura.

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